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quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Camila Vallejo: ''milagre econômico chileno é pesadelo''


Segunda mulher na história do Chile, o seu país, a ser eleita como presidente da Federação de Estudantes (universitários). Militante da Juventude Comunista, graduada de Geografia, Camila Vallejo é com 23 anos, uma jovem que rompe todos os esquemas.


A direita tratou de ressaltar a sua indubitável beleza física, e de atraí-la ao redil do bom comportamento. Tem tudo para "triunfar", diz hipocritamente. Ela não se deixa. "É comum que desviem a atenção dos temas de fundo propondo questões superficiais como prioritárias. Objetivamente sou bonita e não tenho problema em o dizer, mas eu não decidi qual ia ser a minha aparência. O que sim decidi é qual é o meu projeto político e o meu trabalho com a gente" respondia a uma revista chilena do "coração", que apontava também algumas das suas preferências musicais: a trova, Serrat, Chinoy, Ismael Serrano.

E já que os meios não podem cooptá-la, então tratam de reduzir o alcance social do movimento à liderança (perverso ou oportunista) de uma pessoa, para depois demonizá-la. Sobre este tópico respondia também: "A personificaçao do movimento deve-se aos políticos e os meios de comunicação. É uma estratégia que se utiliza muito frequentemente com os que se levantam com reivindicações sociais. No Chile aplica-se muito, e acho que em outros países do mundo também. Em Cuba fala-se de castrismo, na Venezuela de chavismo. Tudo se personifica com os supostos líderes, e não se vê que é um processo partilhado pela maioria" (BBC Mundo).

Camila participou na chamada "Rebelião dos Pinguins" em 2006 (os estudantes secundaristas chilenos recebem esse sobrenome pelo uniforme alvinegro que usam), e é a porta-voza dos atuais protestos contra o modelo neoliberal na educação universitária, um movimento estudantil que sacudiu a toda a sociedade chilena. Embora parte de iguais premisas – a resistência ao modelo privatizador e a necessidade de construir um mundo alternativo –, o chileno diferencia-se de outros movimentos aparentemente similares, como o de Madri ou o de Nova York: "O movimento estudantil chileno não parte dos indignados – disse Camila a BBC Mundo. Não é um movimento espontâneo, mas um processo longo baseado em uma análise profunda do que acontece no Chile, da injustiça. Entendemos a luta dos indignados, mas no Chile passamos a etapa do descontentamento. Agora, há que olhar em frente e construir uma alternativa para o país."

Apesar da sua intensa agenda de mobilizações, Camila Vallejo concordou a responder em exclusiva as perguntas que La Calle del Medio lhe fez chegar para os leitores cubanos.

Alguns "experientes" costumavam dizer nos anos 1990 que as novas gerações de chilenos – após anos de ditadura –, eram conformistas, passivas, individualistas, este renascer dos movimentos sociais juvenis no Chile é inesperado?

Efetivamente, grande parte da juventude durante muito tempo assumiu o papel que o modelo neoliberal lhe quis impor, atuando de maneira absolutamente conformista e desligada da realidade nacional e do que ocorria na política ou no mundo social, somado ao temor inculcado de se manifestar publicamente, por causa das fortes ameaças de repressão que o governo ainda desata sobre a população. No entanto, no Chile também temos uma vasta história de luta social, da qual os jovens constantemente foram uma parte ativa e dinamizadora, embora durante muito tempo isso se deu a contracorrente.

No entanto, neste ano a necessidade e desejo de manifestar-se, de participar e exigir um espaço na tomada de decisões calhou muito fundo na juventude, o que contribuiu o inédito elemento da massividade nas mobilizações, sobordando locais públicos como nunca antes se tinha visto no país. Isso é novo e muito esperançador, já que parece ser que aquela juventude individualista está a deixar de lado esse tipo de atitudes e está a entender que todos estamos chamados a realizar mudanças e a trabalhar por construir um futuro melhor para o nosso país.

Então assim nos damos conta que em realidade muitos jovens têm uma opinião, que não estavam a manifestar, mas que estavam a esperar a ocasião para dar a conhecer.

És parte de uma geração com várias experiências mobilizadoras, desde os dias da chamada "Rebelião dos Pinguins" em 2006, quanto madurou o movimento estudantil no Chile?; daquela primeira experiência, que lições soube tirar?
Em primeiro lugar, algo que constantemente se destaca a respeito das diferenças e aprendizagens do movimento dos Pinguins do 2006 é o sentido amplo e cidadão do atual movimento. Isto é, agora assumimos que as mudanças em educação realizar-se-ão pela ação conjunta de múltiplas organizações sociais capazes de juntar as suas forças em favor do nosso objetivo, e não só com o atuar isolado dos estudantes, pois, ditas mudanças são uma preocupação nacional, e não só gremial, como se queria julgar em anos anteriores.

Por outro lado, quanto à experiência acumulada a respeito do relacionamento entre os governos e o mundo social, nós já aprendemos que a unidade e a mobilização são duas ferramentas indispensáveis ao momento de atuar, pois a direita sempre procurará nos dividir de maneira que sejamos os mesmos estudantes quem nos dividamos em torno de debates desnecessários. Aliás, agora sabemos que ante qualquer oferecimento do governo devemos exigir garantias que nos permitam ter um mínimo nível de confiança para iniciar as conversas que nos levem a solucionar qualquer conflito.

Por isso hoje o diálogo está paralisado, por causa da intransigência do governo e a sua incapacidade para ceder ante mínimos pedidos. No entanto, seguimos mobilizados, pois não nos deteremos até ver resultados concretos, o qual constitui outra aprendizagem: não baixar os braços antes de tempo.

As transnacionais de imprensa seguem falando do "milagre econômico chileno", como vivem os estudantes esse "milagre"?
Lamentavelmente, o que alguns chamam milagre, para muitos foi e continua sendo um pesadelo. Tanto no sentido político mais duro do que significou a ditadura no Chile e as vidas que cobrou para implantar o atual sistema neoliberal, como no sentido econômico, quanto às violentas transformações que sofreu a nossa economia e inclusive o nosso Estado, a fim de perpetuar negócios milionários para algumas poucas famílias deste país, a costa do empobrecimento e crescente desigualdade na distribuição da riqueza para a maioria da gente, além de afetar os serviços públicos que se viram privatizados quase na sua totalidade, desde a água até a saúde e a educação.

Neste sentido, às universidades existentes até o momento do golpe de estado tirou-se-lhes quase 70% de financiamento e deveram começar a cobrar altos impostos para poder autofinanciarse através do pagamento das famílias, o qual fez com que o rendimento à educação superior estivesse determinado pelo nível económico dos estudantes. Ademais, nesse momento permitiu-se a criação de universidades e institutos técnicos privados cuja intenção principal era lucrar e não educar, o que provocou a proliferaçao de centos de estabelecimentos de baixa qualidade, que se lucravam com os sonhos de progresso de famílias completas.

A isso há que lhe somar que as escolas públicas também se empobreceram e que se permitiu a criação de escolas com "financiamento partilhado ou subvencionado", nos que se lhes permite a privados abrir colégios e receber dinheiros do estado e das famílias para sustentar tanto a escola como o peto do dono, o qual debilitou gravemente a educação pública e significou que as pessoas mais pobres só pudessem aceder a uma educação de baixa qualidade que não lhe permite entrar à universidade nem melhorar a sua condição de vida. Em frente a todo isso é que hoje nos rebelamos como estudantes e como sociedade em general, apresentando as nossas demandas, reflexo de uma conceção social de como deveria ser a educação no Chile.

Pelas palavras de ordem do estudantado, é evidente o regresso de Salvador Allende, dos seus sonhos truncados, os jovens chilenos começam a revalorizar o passado?, como seria o Chile dos seus sonhos?
Não poderia assegurar que acontece em todo o movimento, mas acho que entre muitos integrantes do movimento há uma alta valorização de Allende como o único Presidente que levou a cabo um projeto popular de governo. Isso é algo muito emotivo, pois aí se produz um ponto de encontro entre as novas gerações e as gerações passadas, que viveram aquele formoso esforço de construir a via chilena ao socialismo, brutalmente coartado pela ditadura. No entanto, aqueles gestos que nos permitem recordar, refletem ao mesmo tempo a atual necessidade de ter um governo unido estreitamente à gente, que leve um programa cidadão e não funcional aos grandes conglomerados de poder nacionais e trasnacionais que hoje dominam o país.

Nesse senso, para além de tão só revalorizar o passado, eu acho que hoje somos parte da construção de um futuro diferente, a cargo de apresentar um projeto social para a educação e para todas as outras necessidades com as que carrega o nosso país. Isto, claramente envolve a todo o tipo de atores, desde os estudantes aos trabalhadores, donas de casa, etc. quem temos o dever de não abandonar este processo que está em ascendência, o que hoje chamamos "A Primavera do Povo do Chile", que com justa razão estamos a fortalecer, pois chegou para ficar.

Receberam o apoio de outras federações latinoamericanas de estudantes? A Federação de Estudantes Universitários de Cuba também emitiu um comunicado de solidariedade, sentem-se parte de um movimento continental?
Felizmente o apoio internacional proveniente de jovens de todo mundo foi incondicional e muito gratificante; permitiu-nos conhecer o alcance do que passa no Chile e ao mesmo tempo nos abriu numerosas portas de solidariedade internacional. aprendemos da experiência de muitos colegas ao redor do mundo e da América Latina, trocámos apreciações e conhecimentos tanto de educação como das vivências nos movimentos sociais, principalmente através de instâncias de comunicação como o são as redes sociais, mas também de maneira concreta, como aconteceu no (encontro da) OCLAE, congresso ao que assistiram centenas de companheiros chilenos com a intenção de dar a conhecer a nossa luta, mas também de afianzar aquele sentimento de unidade latinoamericana muitas vezes difícil de praticar no nosso país, mas que em momentos como estes é tão necessário e parece sair a flutue de maneira natural, ao reconhecer em tantos estudantes aquela convicção de que a luta que hoje estamos a dar no Chile, amanhã poderia se dar em qualquer outro país irmao, e não duvido que na medida da sua justiça nós os estaremos a apoiar de maneira recíproca.

Fonte: Cuba Debate, tradução do Diario Liberdade

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