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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Nota sobre o CNS

Apesar da existência do Conselho Nacional de Saúde (CNS) ser bem antiga, seu formato atual (organização, estrutura, designação de representação etc.) e atuação são recentes. Contudo, nem tão recentes são os embates travados interna e externamente àquele espaço e as dificuldades encontradas para que de fato o CNS se configure enquanto instrumento de democratização do Estado no que diz respeito às políticas públicas de saúde.

Atualmente se fala em crise do CNS, bastante em razão dos conflitos desencadeados por conta do processo de eleição da Mesa Diretora iniciado em dezembro de 2010. O conflito se deve a uma entendida divergência entre interpretações do ditame do decreto presidencial, da lei 8142/90 e o regulamento interno do CNS. Desde lá, muito já se ventilou a respeito de certo e errado na condução do processo, de legítimo e ilegítimo, e o que parece ter ficado claramente em segundo plano é a política.

Não é de hoje que são percebidas dificuldades e limitações nos conselhos de maneira geral, mas, em se tratando do CNS, existem dificuldades de diversas ordens. Parece existir ainda forte presença de corporativismo, o que dificulta muitas vezes a condução propositiva dos trabalhos e a discussão das verdadeiras demandas do SUS. Há a sensação de que um segmento sente-se mais legítimo que o outro, tirando a credibilidade de alguns debates e priorizando outros, como se, pelo menos em essência, todos não estivessem ali presentes com um só objetivo, o de fortalecer o SUS.

No que tange à representação, há ainda entidades e categorias bastante expressivas dos usuários e dos trabalhadores que não fazem parte do CNS e estão continuamente atualizando e reciclando suas ideias. Buscar ser o mais representativo possível deve ser uma preocupação, como já o disse em texto publicado anteriormente a Dra. Ligia Bahia, da ABRASCO. Outra questão a pensar é a da representatividade dos conselheiros em suas categorias e o compromisso real das entidades que estão lá representadas com o debate político. Algumas entidades representam seus pares com maestria e proporcionam profundas e capilares reflexões. Entretanto, no contraponto, algumas entidades sub-representam seus pares, não proporcionando adequado debate político, empobrecendo sua atuação e a do próprio conselho.

Também enquanto debilidade há a dificuldade do CNS em dialogar com a sociedade, dar publicidade as suas ações e opiniões. No papel de instância máxima do controle social em saúde, o órgão deve buscar meios de ser mais permeável e acessível, e para tal, é necessário por parte das entidades que o compõem mais ações de oxigenação de seus quadros e maior inserção nas suas bases. Para contribuir qualificadamente, é preciso ampliar, renovar.

Essas questões, no momento de eleição da Mesa Diretora e do presidente, deveriam estar alicerçando o debate. Todavia, o que parece interessar mais no momento é a simples escolha do dirigente máximo, como se apenas uma figura sozinha tivesse a possibilidade de resolução das atuais dificuldades.

Para que se situe a discussão, é importante registrar que a eleição será nesta quarta- feira, 16 de fevereiro. O processo que a princípio deve se encerrar nesta semana já bastante conflituoso é ainda objeto de polêmica, vistas as candidaturas postas. Jurema Werneck, pelo segmento dos usuários, e ventila-se o nome de Alexandre Padilha, ministro da Saúde pelo segmento dos gestores. O atual presidente do CNS, do segmento dos trabalhadores, retirou seu nome da disputa apoiando o nome dos usuários. Cabe registrar que a eleição de Francisco Junior, foi imensamente simbólica. Foi o primeiro eleito pelo CNS, primeiro não ministro a presidir o Conselho e sua atuação foi fortemente marcada por exposição de idéias e debates na defesa do SUS em sua essência, com um CNS buscando maior amplitude e destaque na sociedade.

Parece existir certo desconforto com o nome de Padilha, além de pressão de algumas entidades e de parte do segmento dos gestores para a renúncia de Jurema. Para os partidários de ambos existe uma série de argumentos para defesa dos nomes.

Os que defendem Padilha afirmam que, em sendo o ministro presidente do CNS, haverá maior e direto diálogo com o Ministério, agilizando a atuação do CNS e lhe dando maior visibilidade e respaldo, um ‘salto de qualidade’. Contudo, para que isso ocorra, é necessário que Padilha seja o presidente? O CNS só é legítimo e digno de apreciação e respeito quando o presidente é o ministro?

Jurema, médica e militante do Movimento Negro, é claramente enraizada nos movimentos sociais e tem bastante apoio. Há os que digam que nunca foi tão possível um usuário ocupar a presidência do CNS.

Sobre as duas candidaturas, há o que se considerar. Sobre Padilha, é preciso cautela, considerando as dificuldades potenciais por seu cargo no governo, pela tendência em privilegiar pautas e discussões, do risco do CNS tornar-se um apêndice do Ministério da Saúde e da possível presença de amarras e constrangimentos num espaço que deve ter por tradição o debate franco e aberto.

Jurema tem a vantagem de sua candidatura representar renovação e ineditismo, o que é bastante interessante. Um dos desafios do CNS e das entidades que o compõe é o de buscar envolver a população, de não ser um espaço de cartas marcadas e ela pode contribuir bastante com isso. Contudo, esta questão não é responsabilidade apenas do presidente do conselho, nem de uma só entidade ou segmento, e sim de todos. Será um trabalho de muitas mãos.

Em ano de Conferência, momento onde a sociedade deve mobilizar-se para discutir e fortalecer o controle social, um dos maiores patrimônios do SUS, se faz necessário muito trabalho, discussão e mobilização para que realizemos uma grande e qualificada atividade. Para tal, independente de quem presida, há de haver protagonismo e empenho do CNS. Sua relevância, legitimidade e alcance serão questão de postura e maturidade, tanto do governo quanto do coletivo que compõe o conselho. Não pode ser um jogo de perde e ganha, muito menos um quintal de interesses corporativos. Como já o disse o professor Tulio Franco, a legitimidade do CNS será proporcional ao seu grau de ousadia. Seja quem for o presidente eleito, ele deve ser o primeiro a hastear a bandeira do SUS e a pautar a política de novo ao centro.

Jouhanna Menegaz é mestranda em Enfermagem na Universidade Federal de Santa Catarina e dirigente nacional da UJS.

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